A decisão do corregedor-geral de Justiça do Estado de Alagoas, desembargador Fábio José Bittencourte Araújo, exonerou por “quebra de confiança” o tabelião Célio Bezerra Duarte do Cartório do 2º Ofício de Registro de Notas e Títulos de União dos Palmares.
O corregedor designou ainda Jefferson da Silva Neco Júnior para responder pela repartição. A decisão é resultado de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) que averiguou irregularidades relacionadas à lavratura de procurações públicas, supostamente fraudulentas. Inclusive, de pessoas já falecidas.
Conforme a denúncia do Ministério Público do Estado de Alagoas (MPAL), foram lavradas no Cartório do 2º Ofício diversas procurações falsas, envolvendo outorga de poderes do “Grupo Globo”, de propriedade da empresária Eliane do Globo Torres, em atividades de sonegação fiscal de tributos.
As procurações e o reconhecimento da firma teriam sido lavrados de forma indevida em favor da organização criminosa, alvo da operação Gambito da Rainha, deflagrada em 2 de dezembro de 2020, embora não tenha sido confirmada a participação de Célio no esquema milionário.
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Além do tabelião do 2º Ofício de Registro de Notas e Títulos de União dos Palmares, a esposa dele, Ana Maria Barbosa, antiga tabeliã substituta, foi punida com sanção disciplinar de pena de multa, no importe de R$ 5.500 – correspondente a cinco salários mínimos vigentes no País.
“Considerando o caso concreto, em que fora noticiada e constatada a elaboração de procurações falsas, envolvendo, inclusive pessoa já falecida, Célio Barbosa e Ana Maria, respectivamente tabelião interino e ex-tabeliã substituta, incorrem na infração prevista no art. 31, inciso I, da Lei 8.935/199”, ressalta a decisão.
O corregedor determinou ainda, diante dos indícios da participação de Carla Braz dos Santos na elaboração de uma procuração pública falsa, envolvendo uma pessoa já falecida, a instauração de outra sindicância administrativa, “constando no polo passivo apenas a mencionada antiga tabeliã substituta da serventia”.
“Fui vítima”
Ao BR104, nesta quarta-feira (19/05), Célio Duarte afirmou ser “vítima” e contou que tudo começou quando um homem procurou a repartição, no ano de 2015, para fazer uma procuração por Deneval Marques da Silva, falecido em 17 de agosto de 2012, nome pelo qual estava registrado o conglomerado Globo.
Segundo Célio, na época, quem assinou o documento foi a tabeliã substituta, Carla Braz dos Santos. “Contudo, Carla foi vítima, como poderia ter feito eu, poderia ter feito minha esposa ou qualquer um poderia fazer, que a gente não tem olho fino pra saber se aquele documento é verdadeiro ou é falso”.
Entretanto, o ex-tabelião questiona o fato de “quem cometeu o crime diante do cartório” não ter sido chamado para prestar esclarecimentos, uma vez que, na procuração, consta os dados das testemunhas, além do outorgante e da outorgada – pessoa que se beneficiou do documento.
O filho dele, Célio Duarte Barbosa Filho, também foi citado no processo, porém, em virtude de não haver provas de que ele fazia parte do quadro de funcionários da serventia na época dos fatos, teve o seu nome removido, não sofrendo qualquer penalidade administrativa.
O ex-tabelião ressalta que, embora pretenda recorrer da decisão, a intenção dele era mostrar a sua inocência. “O que eu queria provar era minha inocência, e que eu nem conhecia, nem conheço ninguém daquele povo e nem tem minha assinatura em parte nenhuma desse processo”, afirmou.
Gambito da Rainha
No dia 2 de dezembro de 2020, o Gaesf foi às ruas para deflagrar a operação Gambito da Rainha. Naquela ocasião, foram expedidos oito mandados de prisão, sendo três preventivos e cinco temporários, e mais 30 mandados de busca e apreensão em Alagoas e Pernambuco, todos pela 17ª Vara Criminal.
Os alvos foram pessoas ligadas, direta ou indiretamente, ao conglomerado de empresas da “Eliane do Globo” que funciona no município de União dos Palmares, município localizado no interior alagoano.
Na mesma semana, uma nova fase da operação aconteceu. E, dessa vez, as medidas cautelares foram cumpridas em um cartório de Maceió.
A operação Gambito da Rainha recolheu documentos para fins de investigação e ainda apreendeu diversos veículos, além do bloqueio de bens móveis e imóveis, que já estão à disposição do Poder Judiciário.
O Gaesf, além do Ministério Público do Estado de Alagoas (MPAL), é integrado pela Secretaria de Estado da Fazenda, Procuradoria-Geral do Estado, Polícia Civil e Polícia Militar de Alagoas.
Presos
Além da empresária Eliane Torres Omena, proprietária do conglomerado “Globo”, outras seis pessoas foram presas e conduzidas à sede do Gaesf, em Maceió, acusadas de envolvimento no esquema criminoso. Dois auditores-fiscais estão envolvidos na organização criminosa e foram afastados dos cargos.
Entre os presos está o gerente do supermercado “Globo”, Gilvan Silva, que trabalha há mais de 30 anos no estabelecimento comercial. Inclusive, ele aparece em uma foto no Instagram ao lado de Eliane. Também foram presos Tamires Lopes, Linaldo Leandro e outras três pessoas, cujas identidades não foram reveladas.
Armas
Após a prisão da empresária, uma equipe do Batalhão de Polícia de Radiopatrulha (BPRp) encontrou um arsenal na mansão de Eliane. A ação foi um desdobramento da operação ‘Gambito da Rainha’, que investiga uma série de crimes, como fraude societária, lavagem de bens e falsidade ideológica.
De acordo com um relatório do BPRp, foram encontradas uma carabina, uma espingarda calibre 12 e seis pistolas, sendo três nove milímetros, uma calibre .45, uma .380, uma 635 de numeração raspada e quase 400 munições.
Célio nega participação em esquema milionário
Três dias após ser denunciado pelo Ministério Público do Estado de Alagoas (MPE-AL), por meio do Grupo de Atuação Especial no Combate à Sonegação Fiscal e Lavagem de Bens (Gaesf), o então chefe do Cartório do 2º Ofício de Registro de Notas e Títulos de União dos Palmares, Célio Duarte, se pronunciou.
“[…] Há 23 anos que fui nomeado, nunca recebei reclamação. Vinte e três anos, graças a Deus de nome limpo. Eu não temo. Eu não estou preocupado. […] Só estou um pouco triste e revoltado porque estou pagando por uma coisa que eu não sei. Além de não dever, eu não sei o que está acontecendo”, desabafou.
O Ministério Público do Estado de Alagoas (MPE-AL), por meio do Grupo de Atuação Especial no Combate à Sonegação Fiscal e Lavagem de Bens (Gaesf), denunciou a proprietária do conglomerado “Globo”, Eliane do Globo e mais 19 pessoas, pelos crimes de lavagem de bens, corrupção de agentes públicos e organização criminosa.
Proposta no dia 18 de dezembro de 2020, a ação penal foi ajuizada perante a 17ª Vara Criminal da Capital, de combate ao crime organizado, e está ligada às investigações da ‘Operação Gambito da Rainha’, que foi deflagrada no início do mês em União dos Palmares e Maceió.
Foram denunciados à Justiça:
• Eliane do Globo Torres;
• Emerson Douglas Torres de Omena;
• Ana Karoline Torres de Omena;
• Petrúcio Augusto Pereira da Silva Júnior (contador);
• Thalles Roberto Rocha Emery (advogado);
• Francisco Manoel Gonçalves de Castro (auditor-fiscal);
• José Gonzaga de Medeiros (auditor-fiscal);
• Marcos Mouzart de Almeida Costa (auditor-fiscal);
• Edgar Sarmento Pereira Filho (auditor-fiscal);
• Célio Barboza Duarte (tabelião);
• Ana Maria Barbosa Duarte (tabelião);
• Evaldo Bezerra Barbosa (militar da reserva);
• Emanuel Raimundo dos Santos (aposentado da Sefaz);
• Lucas André de Souza Alves;
• Tamires da Silva;
• Linaldo Leandro do Nascimento;
• Gilvan José da Silva;
• Arnóbio Isaías da Silva Filho;
• Elaine Cristina Gonçalves;
• Moésio Lima da Silva.