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São José da Laje

Rombo de R$ 60 milhões em São José da Laje envolve faxineiro, políticos e empresários; MP investiga

Esquema sofisticado usava laranjas e empresas de fachada para lavar dinheiro público, segundo investigação do Ministério Público. BR-104 teve acesso exclusivo aos documentos.

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São José da Laje | © Reprodução
São José da Laje | © Reprodução

O Ministério Público do Estado de Alagoas investiga um esquema criminoso milionário envolvendo um agente político em exercício, ex-gestores, servidores públicos municipais e empresários ligados a empresas de fachada, com ramificações fora da comarca de São José da Laje.

A apuração teve início após a Promotoria de Justiça local receber um Relatório de Inteligência Financeira (RIF) do COAF, e levou à instauração do Procedimento Investigatório Criminal nº 06.2025.00000147-1, formalizado em 3 de abril de 2025.

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O documento, obtido com exclusividade pelo BR104, revela a atuação de uma organização criminosa estruturada para ocultar recursos de origem ilícita por meio de operações financeiras atípicas, incompatíveis com a renda dos investigados. O promotor Carlos Eduardo Baltar Maia, responsável pela Promotoria de Justiça da cidade, assinou a portaria que abriu a investigação e determinou o sigilo dos autos devido à gravidade dos fatos.

O esquema teria movimentado, segundo o MP, valores que ultrapassam R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais), com forte indício de peculato, lavagem de dinheiro, organização criminosa e sonegação fiscal.

Os personagens do esquema

Segundo o relatório anexado aos autos, há cinco alvos principais, identificados apenas por suas iniciais, além de outros envolvidos de maneira indireta. O principal nome citado é C.J. da S.J., um agente político em exercício no Município de São José da Laje, que declarou renda de R$ 8.500,00 (oito mil e quinhentos reais), mas movimentou R$ 25.193.890,00 (vinte e cinco milhões, cento e noventa e três mil, oitocentos e noventa reais) entre maio de 2020 e janeiro de 2024. Os recursos recebidos incluem valores vindos de servidores municipais, como G.L.G., assistente administrativo da prefeitura.

C.J. repassou valores à sua irmã, C.M.M.S., que é ex-servidora da saúde municipal e titular da empresa de pequeno porte C.M.M.S.A.. Mesmo tendo declarado remuneração de apenas R$ 1.353,20 (mil trezentos e cinquenta e três reais e vinte centavos), e posteriormente R$ 6.540,00 (seis mil quinhentos e quarenta reais), ela movimentou R$ 22.415.330,00 (vinte e dois milhões, quatrocentos e quinze mil, trezentos e trinta reais) entre novembro de 2018 e janeiro de 2024. Um dos extratos bancários revela que uma conta com mais de R$ 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil reais) em movimentações tinha como procurador o próprio irmão, C.J. da S.J., o que indica possível interposição de pessoa para encobrir patrimônio.

Outro alvo central é W.L.L. de O.L., sócio da empresa W.E. Ltda. Embora sua remuneração funcional fosse de apenas R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), ele movimentou R$ 6.156.182,00 (seis milhões, cento e cinquenta e seis mil, cento e oitenta e dois reais) entre setembro de 2021 e março de 2024. A empresa sob sua gestão declarou faturamento de R$ 1.213.318,00 (um milhão, duzentos e treze mil, trezentos e dezoito reais), mas movimentou R$ 37.052.892,00 (trinta e sete milhões, cinquenta e dois mil, oitocentos e noventa e dois reais), com grande parte dos recursos provenientes de entes públicos.

A empresa C.M.M.S.A., que nunca teve funcionários, declarou um faturamento de R$ 2.123.587,80 (dois milhões, cento e vinte e três mil, quinhentos e oitenta e sete reais e oitenta centavos), mas movimentou R$ 8.746.334,00 (oito milhões, setecentos e quarenta e seis mil, trezentos e trinta e quatro reais) entre fevereiro de 2022 e janeiro de 2024, sendo beneficiária de repasses da prefeitura de São José da Laje, do agente político C.J. da S.J. e da própria C.M.M.S. Parte do dinheiro da empresa foi usado para pagar títulos de C.J. e da própria C.M.M.S.

Outros nomes aparecem na cadeia de transações financeiras, como L.H. da S.N., ex-agente político entre 2017 e 2020, que recebeu valores de C.M.M.S. e de C.J., e o servidor R.C. de A.J., ocupante do cargo de faxineiro, que também aparece como destinatário de transferências bancárias. Mesmo com vínculo de baixo escalão, ele movimentou R$ 1.491.825,00 (um milhão, quatrocentos e noventa e um mil, oitocentos e vinte e cinco reais) no período analisado, valor completamente incompatível com a função que exerce.

O relatório do COAF descreve operações com características típicas de lavagem de dinheiro, como:
• Depósitos e saques em espécie feitos de forma parcelada para evitar comunicação obrigatória às autoridades;
• Transferências entre contas sem justificativa econômica plausível;
• Uso de contas de pessoas politicamente expostas e familiares;
• Pagamentos vinculados a contratos públicos;
• Fragmentação deliberada de valores e uso de múltiplas contas bancárias.

A atuação do Ministério Público

O promotor Carlos Eduardo Baltar Maia fundamenta a instauração do PIC em diversos dispositivos legais, como os artigos 129 da Constituição, 26 da Lei 8.625/93, além da Resolução CNMP nº 181/2017. A investigação, segundo ele, visa aprofundar a apuração de infrações penais de natureza pública, com destaque para os crimes descritos nos artigos 312 do Código Penal (peculato), 1º da Lei 9.613/98 (lavagem de dinheiro) e 1º da Lei 12.850/13 (organização criminosa).

Para isso, a Promotoria solicitou, ainda no dia 4 de abril, apoio técnico do GAECO (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) e do Núcleo de Gestão da Informação (NGI) do MP/AL. O ofício com o pedido de cooperação técnica foi endereçado ao Procurador-Geral de Justiça, Lean Antônio Ferreira de Araújo, que acolheu a solicitação e, por despacho, encaminhou o caso ao GAECO para manifestação.

A Assessora Técnica Amanda Cury Geraldes, por ordem da PGJ, comunicou oficialmente o coordenador do GAECO, o promotor de Justiça Napoleão José Calheiros Correia de Melo Amaral Franco, sobre o envio dos autos, no dia 7 de abril, conforme o Processo nº 02.2025.00003408-4.

O caso agora está sob a alçada do GAECO, que poderá requerer quebra de sigilos, busca e apreensão, interrogatórios e diligências sigilosas, em articulação com outros órgãos de investigação.

Trama sofisticada e impacto público

A Promotoria de São José da Laje classificou o caso como altamente complexo, com transcendência territorial, isto é, com repercussão além dos limites do município. O envolvimento direto de um agente político no exercício do mandato, além do uso de familiares e empresas de fachada, indicaria uma engenharia criminosa voltada à drenagem de recursos públicos, com profissionalização e divisão de tarefas.

Segundo o MP, as movimentações financeiras eram mascaradas para dificultar a identificação dos beneficiários finais. Isso foi feito por meio de fragmentações de depósitos, simulações de prestação de serviço e movimentação cruzada entre contas pessoais e empresariais, estratégia comum em práticas de lavagem de capitais.

Apesar da gravidade das acusações, nenhum dos envolvidos foi formalmente denunciado até o momento. O processo segue em fase de investigação sigilosa.

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